Tecnologia aliada à ciência deve revolucionar farmacologia

Avanços como inteligência artificial possibilitam nova fase da farmacologia, com desenvolvimento de novos medicamentos e foco na medicina de precisão.

30 Nov, 2023

A tecnologia, em especial a inteligência artificial (IA), tem permitido avanços sem precedentes na medicina. Da gestão de instituições e formação de profissionais ao apoio na decisão clínica e até análises de exames de imagens, diversas áreas já se beneficiam dessa evolução. E a farmacologia é uma delas. A ciência responsável por estudar como uma molécula ou medicamento interage em organismos vivos – ponto de partida para se desenvolver novas terapias – tem se apoiado na inovação tecnológica para dar saltos maiores, principalmente no campo da medicina de precisão. A combinação de IA, nanotecnologia e conhecimento científico pretende garantir não só a redução de custos e de tempo na busca de novas moléculas, como também mais eficiência e precisão na hora de selecioná-las. Por isso, segundo Lionel Gamarra, doutor em física e nanobiotecnologia e pesquisador no Hospital Israelita Albert Einstein, o foco na medicina de precisão tem impulsionado essa nova era farmacológica.“As terapias gênicas estão nos direcionando para terapias mais específicas, principalmente com base no avanço acelerado da inteligência artificial, que tem ajudado bastante na descoberta de medicamentos”, afirma o pesquisador. “Muitas vezes, essas pesquisas levam tempo e a IA permite encontrar, a partir de uma grande base de dados e algoritmos, diferentes tipos de genes incomuns relacionados a determinada doença. Isso agiliza o processo de compreensão dos padrões complexos das patologias.”

 É um cenário completamente diferente de vinte anos atrás, como lembra Fernando Cunha, farmacologista e ex-presidente da Sociedade Brasileira de Farmacologia e Terapias Experimentais (SBFTE): “Há duas décadas, era muito comum você partir de uma cultura popular, onde o uso de um medicamento acontecia sem saber exatamente como ele agia. Além do mecanismo de ação, a avaliação de efeitos colaterais, posologia, análise quantitativa, tudo isso é feito pela farmacologia.”

Tecnologia como aliada da farmacologia na prática

As terapias gênicas e moleculares apresentam de fato potencial disruptivo. Isso porque, ao mesmo tempo que o desenvolvimento de novos fármacos evolui, a tecnologia também permite um entendimento maior das doenças em si. Neste contexto, com estudos cada vez mais focados em desvendar a morfologia de tumores, a oncologia é uma das principais áreas beneficiadas pelas chamadas terapias-alvo. Comparado aos métodos tradicionais, esse perfil de tratamento possibilita menos efeitos colaterais e maior efetividade, uma vez que atua somente sobre as células cancerígenas, preservando o resto do organismo. A própria sobrevida de pacientes que recebem terapias-alvo tem se mostrado superior à encontrada naqueles que recebem quimioterapia convencional, segundo estudo publicado na revista Cancer Control.Outra descoberta igualmente revolucionária no campo da farmacologia foi a imunoterapia, que está cada vez mais refinada. Ao contrário das terapias-alvo, que atacam diretamente as células cancerígenas, a imunoterapia ativa o próprio sistema imunológico do paciente para combater a doença.

Há ainda o elemento da biodisponibilidade – que define a extensão e a velocidade com que a substância ativa de um medicamento circula e age no organismo, e pode impactar a frequência e o tamanho da dosagem recomendada durante o tratamento –, um dos focos farmacológicos atuais, com a nanotecnologia como principal aliada nesta última década. “Quando um medicamento é administrado numa quantia determinada para chegar a tal região, muitas vezes são aplicadas, por exemplo, cem unidades da substância, mas apenas duas ou três chegam ao destino, o que afeta a eficácia do tratamento”, explica o pesquisador do Einstein. “Nessas últimas décadas, estamos buscando medicamentos com maior biodisponibilidade e que sejam direcionáveis, para reduzir também os efeitos colaterais.” A área de doenças neurológicas e psiquiátricas é outra que deve se beneficiar com todos esses avanços. Afinal, hoje, um dos principais desafios para o desenvolvimento de remédios mais efetivos para doenças como Alzheimer e depressão é a dificuldade de compreender a morfologia dessas condições devido à complexidade do sistema nervoso. “O cérebro não é um órgão que você consegue desmontar e montar novamente com facilidade”, afirma Cunha.Ele acredita que o aprimoramento da IA pode permitir um olhar mais sofisticado do cérebro ao possibilitar a construção de modelos de imagens recriadas a partir de ressonância e unidas digitalmente: “A IA permitiria essa reconstrução no computador e, a partir daí, poderíamos entender melhor o seu funcionamento com o auxílio da bioinformática”.

Colaboração e olhar multidisciplinar

A presença de outras áreas da ciência na produção farmacológica é, por si só, uma revolução no setor. Profissionais da nanotecnologia, bioengenharia, biotecnologia, engenharia química e tantos outros trabalham lado a lado nas bancadas e laboratórios para desenvolver novas terapias. “Antigamente, as tecnologias eram desenvolvidas apenas por tecnólogos. Havia até mesmo discussão entre cientistas e tecnólogos”, lembra Cunha. Para ele, há um enorme ganho em fazer ciência de forma multidisciplinar, com diferentes grupos atuando em conjunto. “Você tem clínicos, imunologistas, pessoas de tecnologia, geneticista, todos olhando para a mesma questão. Você não vai ter um profissional que entenda de tudo, é preciso ser capaz de dialogar, de ouvir opiniões diferentes.” No Einstein, a ideia de multidisciplinaridade está presente em todos os projetos da instituição, e segundo Gamarra, é o caminho para moldar a nova era da farmacologia: “A interdisciplinaridade influencia muito na maneira como conduzimos as coisas, e o Einstein tem trabalhado isso. Essa colaboração frente às tendências e novos desafios vai moldar a forma como os medicamentos são descobertos e produzidos nos próximos anos.”

Acesso e regulamentação são desafios

Com tantos avanços e inovações farmacológicas – aliado à tendência de envelhecimento da população – a sustentabilidade financeira do ecossistema de saúde têm sido pauta global de encontros, eventos, publicações científicas e diálogos entre aqueles que constroem o setor. Diante desse cenário, não basta apenas investir em novos fármacos, é preciso pensar também em equidade e acesso – ou seja, em formas de disponibilizar as novas tecnologias para o maior número possível de pessoas. E o potencial é imenso: de acordo com levantamento da IQVIA, em uma publicação do Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos (Sindusfarma), o mercado brasileiro de medicamentos movimentou R$ 106,7 bilhões em 2022, equivalentes a US$ 20,7 bilhões.  “Temos um alto custo de pesquisa no desenvolvimento de um medicamento, o que pode dificultar o acesso aos tratamentos inovadores, que chegam com um valor alto no mercado. Tentar encontrar um equilíbrio entre a inovação e a acessibilidade é crucial no nosso país”, afirma Gamarra.

Outro ponto seria o processo de regulamentação novos medicamentos no Brasil, que ainda é muito demorado. Embora a segurança e os resultados clínicos sejam indispensáveis para a liberação, é preciso reestruturar a etapa burocrática para estimular a indústria nacional. “A regulamentação atual é complexa e chega a demorar 10, 12 anos para aprovar um novo medicamento. Manter o equilíbrio entre a segurança, a eficácia e a agilidade da aprovação é, sem dúvida, um desafio que não pode ser ignorado”, finaliza o pesquisador. 

Fonte: https://futurodasaude.com.br/futuro-da-farmacologia-einstein/

 

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